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Homem que arrancou coração da tia e deixou hospital psiquiátrico gera debate sobre ressocialização e estigma

Homem que arrancou coração da tia e deixou hospital psiquiátrico gera debate sobre ressocialização e estigma
Paciente com transtorno mental crônico estava em hospital de custódia em Cuiabá (MT), e seguirá tratamento ambulatorial em Campinas (SP), sob a tutela do pai, por ordem judicial. Profissional de saúde de Campinas com uniforme do SUS
Carlos Bassan
A alta de um hospital de custódia do homem com transtorno mental crônico que matou e arrancou o coração da tia em 2019, em Sorriso (MT), levantou o debate nas redes sociais sobre ressocialização, saúde mental e estigmas.
Por ordem judicial, ele irá cumprir medidas de segurança ambulatorial em um Centro de Atenção Psicossocial (Caps) de Campinas (SP), sob cuidados do pai, que mora no interior paulista.
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A decisão da 2ª Vara Criminal do Poder Judiciário de Cuiabá destacou que "embora persista o diagnóstico psiquiátrico de transtorno mental crônico e não tenha havido cessação formal da periculosidade, a condição clínica atual do paciente permite o manejo adequado de sua condição no âmbito do tratamento ambulatorial intensivo."
Mas qual o desafio da ressocialização de um paciente com essas características?
Nesta reportagem você vai ler ⬇️
'Minha vida acabou em 2019'
Medo alimentado por casos extremos
Desafios na adesão ao tratamento
Sem previsão de alta
O que determinou o juiz?
Lumar Costa da Silva, de 34 anos
Arquivo pessoal
'Minha vida acabou em 2019'
Para a filha da vítima, a notícia sobre o fim da internação foi recebida com tristeza, e ela afirma esperar que a decisão seja revertida para que "possa continuar a vida em paz e andar tranquilamente nas ruas".
"Infelizmente, agora isso eu não vou conseguir mais. Eu vou ter que me esconder, vou ter que me retrair, que me isolar. É realmente um filme de terror, um daqueles piores que vocês possam imaginar", disse Patrícia.
Ao g1, Patrícia definiu que sua vida acabou em 2019, junto com o assassinato da mãe.
"A minha vida acabou em 2019, junto com a da minha mãe. A minha vida acabou naquele dia também. Eu vivo porque eu tenho meus filhos, porque eu tenho que cuidar deles, então eu tive que prosseguir, tenho que continuar tendo essa força", disse.,
Medo alimentado por casos extremos
Rosana Onocko-Campos, professora do Departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, reconhece como natural o posicionamento de Patrícia, por ter vivenciado uma situação traumática.
No entanto, a especialista alerta que o medo social em torno de pessoas com transtornos mentais graves é alimentado por casos extremos, como esse do paciente desinternado, mas que a discussão sobre o tema não pode ter foco em um caso específico.
Segundo a professora, ocorrências trágicas como essa representam a menor parcela, e que há muito mais crimes violentos "cometidos por normóticos que psicóticos". Ou seja, Onocko-Campos defende que há mais crimes causados por pessoas sem transtornos mentais.
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"Essa ideia de que o 'louco' é perigoso, da periculosidade, sustenta o estigma, por exemplo, contra esses usuários, que precisam de inserção comunitária, emprego, moradia, apoio social. É importante que a gente possa fazer uma contribuição que não aumente, vamos dizer assim, o estigma que já existe."
Questionada se é possível garantir que um paciente com esse histórico não volte a cometer um crime, Rosana Onocko-Campos é enfática:
“Não podemos garantir nada, de ninguém. Mas, com acompanhamento psicoterapêutico, oficinas de reabilitação e medicação adequada, a grande maioria dos pacientes pode ser ressocializada sem problemas", defende.
Desafios na adesão ao tratamento
Coordenadora do grupo de estudos de saúde mental do Instituto de Estudos Avançados da Unicamp, Onocko-Campos explica que é comum que pessoas com transtornos graves muitas vezes não acreditem que tenham o transtorno, o que pode gerar uma dificuldade para adesão ao tratamento.
Mas em situações relacionados a crimes, em que há uma decisão judicial, como é o caso do paciente que matou a tia, o juiz determinou a obrigatoriedade do tratamento no Caps de Campinas.
"A equipe [do Caps] tem essa carta na manga, vamos dizer assim, se em algum momento ele não aderir ao tratamento, faltar. Pode chegar na casa dele e dizer que é obrigado. Essa medida do juiz é correta, e ampara a equipe de saúde ao dar essa deliberação", avalia.
Sem previsão de alta
Karina Diniz, professora doutora do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, explica que ao receber egressos de hospitais de custódia, o acompanhamento deve seguir o que é determinado pelo juiz.
De acordo com a professora, no Caps a pessoa terá o caso avaliado e a equipe vai construir o que é chamado de projeto terapêutico singular, baseado nas necessidades do indivíduo e no que o município e o serviço conseguem oferecer.
"O Caps vai avaliar quais são as capacidades dele, qual que é a capacidade dele de se autogerir, quais são as necessidades dele. O Caps fará os relatórios periódicos ao juízo e comunicará caso ocorra uma piora do quadro, por exemplo, que demande a necessidade de internação em enfermaria psiquiátrica", explica.
A professora explica que a frequência pela determinação judicial será intensiva, e que não há previsão de alta.
O g1 procurou a prefeitura de Campinas para questionar sobre o acolhimento do paciente na rede municipal, mas a administração informou que não iria comentar sobre a decisão judicial.
O que determinou o juiz?
O juiz Geraldo Fernandes Fidelis Neto determinou a desinternação do paciente a partir de 20 de junho, sendo que ele deve dar continuidade ao tratamento e uso das medicações em Campinas (SP), sob supervisão do curador oficial (pai) e do serviço de acompanhamento, com apresentação de relatório trimestral, pelo período mínimo de um ano, sendo depois submetido a nova avaliação.
"Por se tratar de uma doença crônica, persistente e incurável é necessário a supervisão constante e tratamento ambulatorial intensivo contínuo por período indeterminado, mesmo após alta médica sob risco de nova crise psicótica e ato delituoso", diz trecho da decisão.
Mesmo com a alta médica, o paciente terá que cumprir as seguintes medidas:
Comparecimento mensal ao Caps III, localizado em Campinas (SP), a fim de ser submetido a tratamento ambulatorial na forma que a instituição sugerir, devendo ser apresentado relatório do cumprimento da medida;
não se ausentar da Comarca de Campinas (SP), sem autorização da Justiça;
não frequentar lugares inapropriados, como casa de prostituição, casa de jogos, bocas de fumo e locais similares;
não ingerir bebida alcoólica ou fazer uso de qualquer espécie de substância entorpecente.
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