Treta de Duda e Antonela: três reflexões sobre a polêmica que envolve rivalidade feminina, proteção dos homens e superexposição nas redes

Pais e professores podem aproveitar interesse dos jovens nessa briga entre adolescentes influencers para debater temas atuais e delicados. Antonela Braga e Duda Guerra protagonizam briga na internet
Reprodução/Redes sociais
Uma treta homérica entre influenciadoras adolescentes (entenda mais abaixo) dominou as redes sociais e mobilizou a opinião pública na internet — envolveu até um depoimento da apresentadora Angélica, indiretamente ligada à história. Milhares de vídeos de “análise” da briga foram postados por pessoas que, até a semana passada, talvez nunca tivessem ouvido falar de Duda Guerra e Antonela Braga, as protagonistas do conflito.
➡️Se esse assunto surgir na sua casa ou em sala de aula, não o despreze. Segundo especialistas ouvidas pelo g1, a “Malhação” da vida real pode ser a oportunidade ideal para estimular os jovens a refletir sobre:
sociedade patriarcal e rivalidade feminina ‘lucrativa’;
cultura do espetáculo;
impactos da superexposição na saúde mental (das envolvidas e do público).
“Os adultos, em geral, não se importam com isso, mas é o momento de discutirmos sobre o que está acontecendo. Por que julgamos? Como julgamos? Sem palestrinha, mas refletindo coletivamente a partir desse material riquíssimo”, afirma Telma Vinha, pedagoga, doutora em Educação, professora da Unicamp e pesquisadora de clima escolar.
?Antes de ver os detalhes de cada um dos 3 itens, veja um resumo sucinto da história, caso você não tenha sido atingido involuntariamente por ela nos últimos dias:
1- O contexto da viagem
Um grupo de influenciadoras adolescentes viajou para Gramado (RS).
Entre elas, estavam Duda Guerra (nora de Angélica e Luciano Huck, namorada de Benício Huck) e Antonela Braga.
2- O estopim da briga
Antonela teria pedido para seguir o perfil privado ("dix") de Benício Huck, namorado de Duda.
Benício mostrou o “print” para Duda, que ficou incomodada com a atitude da amiga.
3- Reforço do conflito
Anteriormente, Liz Macedo, outra influenciadora, havia dito em um podcast, sem citar nomes, que seu namorado foi xavecado por uma amiga dela.
A internet especulou que Liz estaria falando justamente de Antonela.
Entra, então, a participação de Júlia Pimentel, mais uma influencer que acusa Antonela de ter dado em cima de seu namorado.
4- Reações nas redes sociais
O caso vazou nas redes, e fãs começaram a analisar minuciosamente todos os conteúdos postados ao longo da viagem. Perceberam que Antonela não estava aparecendo na maioria dos vídeos do grupo.
As influenciadoras envolvidas (e outras do mesmo grupo) pararam de se seguir e publicaram indiretas e desabafos nos stories.
5- A entrada de adultos
A mãe de Liz não teria nem cumprimentado Antonela no fim da viagem, quando foram se despedir.
A apresentadora Angélica, sogra de Duda, curtiu um comentário negativo sobre Antonela, o que aumentou ainda mais a tensão.
Depois, Angélica se manifestou dizendo que pediu para a equipe dela apagar comentários inapropriados e ofensivos. E que, nesse processo, houve “um pequeno descuido na moderação, que acabou ampliando o mal-entendido".
6- Repercussão pública
Internautas discutiram quem estava correto na briga. Antonela Braga, por exemplo, ganhou mais de 1 milhão de seguidores após o início da polêmica.
?Reflexão 1: Sociedade patriarcal e rivalidade feminina ‘lucrativa’
Bruna Camilo, doutora em Sociologia e pesquisadora de gênero, misoginia e extrema direita, destaca que a briga reforça o conceito de rivalidade feminina.
“Ela é historicamente construída pelo patriarcado, mas agora se tornou lucrativa. Mostra que as mulheres precisam disputar a atenção dos homens e da sociedade para serem notadas e valorizadas”, afirma.
A culpa disso não é das próprias meninas, explica Camilo. “É algo estrutural. O que a gente faz é performar a rivalidade, para estar sempre na primeira fileira da prateleira do amor”, diz a pesquisadora, citando um conceito de Valeska Zanello, professora no Departamento de Psicologia Clínica da Universidade de Brasília.
O que isso significa? Que, para essas meninas serem vistas, lucrarem e ganharem seguidores, precisam estar expostas na tal “prateleira”. E o resultado disso envolve receberem xingamentos (como “piranha” e “vagabunda”), rótulos ofensivos e ódio coletivo.
“É algo muito nocivo. Nós, mulheres, ficamos em evidência, enquanto os homens, em seus tronos, são tratados como os desejados e disputados. Do que as meninas são capazes para terem notoriedade e amor? Nossa sociedade está doente”, afirma Camilo.
As duas pesquisadoras entrevistadas chamam a atenção para o papel dos meninos na briga: eles pouco aparecem nos tribunais de julgamento das redes sociais. “Eles ficam protegidos”, diz Telma Vinha. “O julgamento coletivo é muito ligado às questões de gênero.”
Para evitar que essa lógica de estereotipação das mulheres continue existindo, as especialistas sugerem que o assunto seja debatido nas salas de aula com todos os adolescentes, não só com as meninas.
“Eles precisam entender que fazem parte dos relacionamentos e que têm responsabilidade no processo. Reflexões assim previnem comportamentos tóxicos no futuro, porque mostram que nenhuma mulher deve lutar pela atenção deles”, diz Bruna Camilo.
?Reflexão 2: Cultura do espetáculo
Telma Vinha lembra que a própria ideia de organizarem uma viagem só de influenciadores tem exatamente a intenção de gerar conteúdo, como em um reality show. E sabemos, tantas edições de Big Brother Brasil depois, que nada gera mais engajamento do que a ocorrência de conflitos.
“Vivemos uma mudança de valores — não digo em sentido positivo ou negativo, mas de mudança mesmo. Éramos educados para manter a privacidade e não contar segredos. Hoje, é a sociedade da exposição”, afirma.
“Você existe se for visto. Para ser visto, precisa ter seguidores. Para ter seguidores, precisa postar conteúdo. E treta é um conteúdo que atrai muita atenção. Nesse raciocínio, se eu potencializo os problemas, potencializo também que eu seja vista.”
➡️Antonela, por exemplo, já ganhou mais de um milhão de seguidores com essa polêmica, como mencionado no início da reportagem. Os nomes das demais envolvidas também bombaram nas buscas entre quarta (7) e quinta-feira (8).
É claro que, quando uma briga é totalmente filmada e exposta para o mundo inteiro, os envolvidos perdem o controle da narrativa. E é esse um dos grandes perigos das redes sociais na adolescência.
“Sabemos como o processo começa, mas não sabemos como a coisa vai andar. Todas as partes se manifestaram no calor do impulso, como sempre fazemos na juventude. Antes, a resposta era ouvida só por quem estivesse presente. Agora, ela fica gravada e é acompanhada por milhões de pessoas. Toma uma dimensão gigantesca e gera linchamento e xingamentos públicos”, afirma Vinha.
?Reflexão 3: Impactos da superexposição na saúde mental (das envolvidas e do público)
Certamente, você já recebeu algum rótulo na escola, fosse o de “nerd”, de “estranho(a)”, de “burro” ou de “galinha”. Só que, até os anos 2000, o tempo passava, os alunos mudavam de turma ou de colégio… depois de tanto sofrimento, ficava mais simples virar a página e começar sua história “do zero”. Agora, tudo é carregado para sempre, explica Vinha.
“Isso gera um ciclo de busca pela validação. Leva a transtorno de ansiedade, depressão, tentativa de suicídio… É uma pressão insana para os adolescentes, que estão justamente na fase de construir sua identidade.”
Telma Vinha lembra que todo o episódio e as possíveis reflexões não devem ser desperdiçados pelos pais. “Já existe um ‘gap’ [lacuna] geracional gigante, um fosso mesmo. Os filhos estão na época do Discord, comentam tudo por lá. Precisamos conhecer o universo deles, interagir com eles: é mais o ‘quero entender’ do que o ‘quero ensinar’”, afirma Telma.
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Rotina-ostentação na faculdade? Alunos fazem piada e mostram miojo de copo e ônibus cheio
Reprodução/Redes sociais
Uma treta homérica entre influenciadoras adolescentes (entenda mais abaixo) dominou as redes sociais e mobilizou a opinião pública na internet — envolveu até um depoimento da apresentadora Angélica, indiretamente ligada à história. Milhares de vídeos de “análise” da briga foram postados por pessoas que, até a semana passada, talvez nunca tivessem ouvido falar de Duda Guerra e Antonela Braga, as protagonistas do conflito.
➡️Se esse assunto surgir na sua casa ou em sala de aula, não o despreze. Segundo especialistas ouvidas pelo g1, a “Malhação” da vida real pode ser a oportunidade ideal para estimular os jovens a refletir sobre:
sociedade patriarcal e rivalidade feminina ‘lucrativa’;
cultura do espetáculo;
impactos da superexposição na saúde mental (das envolvidas e do público).
“Os adultos, em geral, não se importam com isso, mas é o momento de discutirmos sobre o que está acontecendo. Por que julgamos? Como julgamos? Sem palestrinha, mas refletindo coletivamente a partir desse material riquíssimo”, afirma Telma Vinha, pedagoga, doutora em Educação, professora da Unicamp e pesquisadora de clima escolar.
?Antes de ver os detalhes de cada um dos 3 itens, veja um resumo sucinto da história, caso você não tenha sido atingido involuntariamente por ela nos últimos dias:
1- O contexto da viagem
Um grupo de influenciadoras adolescentes viajou para Gramado (RS).
Entre elas, estavam Duda Guerra (nora de Angélica e Luciano Huck, namorada de Benício Huck) e Antonela Braga.
2- O estopim da briga
Antonela teria pedido para seguir o perfil privado ("dix") de Benício Huck, namorado de Duda.
Benício mostrou o “print” para Duda, que ficou incomodada com a atitude da amiga.
3- Reforço do conflito
Anteriormente, Liz Macedo, outra influenciadora, havia dito em um podcast, sem citar nomes, que seu namorado foi xavecado por uma amiga dela.
A internet especulou que Liz estaria falando justamente de Antonela.
Entra, então, a participação de Júlia Pimentel, mais uma influencer que acusa Antonela de ter dado em cima de seu namorado.
4- Reações nas redes sociais
O caso vazou nas redes, e fãs começaram a analisar minuciosamente todos os conteúdos postados ao longo da viagem. Perceberam que Antonela não estava aparecendo na maioria dos vídeos do grupo.
As influenciadoras envolvidas (e outras do mesmo grupo) pararam de se seguir e publicaram indiretas e desabafos nos stories.
5- A entrada de adultos
A mãe de Liz não teria nem cumprimentado Antonela no fim da viagem, quando foram se despedir.
A apresentadora Angélica, sogra de Duda, curtiu um comentário negativo sobre Antonela, o que aumentou ainda mais a tensão.
Depois, Angélica se manifestou dizendo que pediu para a equipe dela apagar comentários inapropriados e ofensivos. E que, nesse processo, houve “um pequeno descuido na moderação, que acabou ampliando o mal-entendido".
6- Repercussão pública
Internautas discutiram quem estava correto na briga. Antonela Braga, por exemplo, ganhou mais de 1 milhão de seguidores após o início da polêmica.
?Reflexão 1: Sociedade patriarcal e rivalidade feminina ‘lucrativa’
Bruna Camilo, doutora em Sociologia e pesquisadora de gênero, misoginia e extrema direita, destaca que a briga reforça o conceito de rivalidade feminina.
“Ela é historicamente construída pelo patriarcado, mas agora se tornou lucrativa. Mostra que as mulheres precisam disputar a atenção dos homens e da sociedade para serem notadas e valorizadas”, afirma.
A culpa disso não é das próprias meninas, explica Camilo. “É algo estrutural. O que a gente faz é performar a rivalidade, para estar sempre na primeira fileira da prateleira do amor”, diz a pesquisadora, citando um conceito de Valeska Zanello, professora no Departamento de Psicologia Clínica da Universidade de Brasília.
O que isso significa? Que, para essas meninas serem vistas, lucrarem e ganharem seguidores, precisam estar expostas na tal “prateleira”. E o resultado disso envolve receberem xingamentos (como “piranha” e “vagabunda”), rótulos ofensivos e ódio coletivo.
“É algo muito nocivo. Nós, mulheres, ficamos em evidência, enquanto os homens, em seus tronos, são tratados como os desejados e disputados. Do que as meninas são capazes para terem notoriedade e amor? Nossa sociedade está doente”, afirma Camilo.
As duas pesquisadoras entrevistadas chamam a atenção para o papel dos meninos na briga: eles pouco aparecem nos tribunais de julgamento das redes sociais. “Eles ficam protegidos”, diz Telma Vinha. “O julgamento coletivo é muito ligado às questões de gênero.”
Para evitar que essa lógica de estereotipação das mulheres continue existindo, as especialistas sugerem que o assunto seja debatido nas salas de aula com todos os adolescentes, não só com as meninas.
“Eles precisam entender que fazem parte dos relacionamentos e que têm responsabilidade no processo. Reflexões assim previnem comportamentos tóxicos no futuro, porque mostram que nenhuma mulher deve lutar pela atenção deles”, diz Bruna Camilo.
?Reflexão 2: Cultura do espetáculo
Telma Vinha lembra que a própria ideia de organizarem uma viagem só de influenciadores tem exatamente a intenção de gerar conteúdo, como em um reality show. E sabemos, tantas edições de Big Brother Brasil depois, que nada gera mais engajamento do que a ocorrência de conflitos.
“Vivemos uma mudança de valores — não digo em sentido positivo ou negativo, mas de mudança mesmo. Éramos educados para manter a privacidade e não contar segredos. Hoje, é a sociedade da exposição”, afirma.
“Você existe se for visto. Para ser visto, precisa ter seguidores. Para ter seguidores, precisa postar conteúdo. E treta é um conteúdo que atrai muita atenção. Nesse raciocínio, se eu potencializo os problemas, potencializo também que eu seja vista.”
➡️Antonela, por exemplo, já ganhou mais de um milhão de seguidores com essa polêmica, como mencionado no início da reportagem. Os nomes das demais envolvidas também bombaram nas buscas entre quarta (7) e quinta-feira (8).
É claro que, quando uma briga é totalmente filmada e exposta para o mundo inteiro, os envolvidos perdem o controle da narrativa. E é esse um dos grandes perigos das redes sociais na adolescência.
“Sabemos como o processo começa, mas não sabemos como a coisa vai andar. Todas as partes se manifestaram no calor do impulso, como sempre fazemos na juventude. Antes, a resposta era ouvida só por quem estivesse presente. Agora, ela fica gravada e é acompanhada por milhões de pessoas. Toma uma dimensão gigantesca e gera linchamento e xingamentos públicos”, afirma Vinha.
?Reflexão 3: Impactos da superexposição na saúde mental (das envolvidas e do público)
Certamente, você já recebeu algum rótulo na escola, fosse o de “nerd”, de “estranho(a)”, de “burro” ou de “galinha”. Só que, até os anos 2000, o tempo passava, os alunos mudavam de turma ou de colégio… depois de tanto sofrimento, ficava mais simples virar a página e começar sua história “do zero”. Agora, tudo é carregado para sempre, explica Vinha.
“Isso gera um ciclo de busca pela validação. Leva a transtorno de ansiedade, depressão, tentativa de suicídio… É uma pressão insana para os adolescentes, que estão justamente na fase de construir sua identidade.”
Telma Vinha lembra que todo o episódio e as possíveis reflexões não devem ser desperdiçados pelos pais. “Já existe um ‘gap’ [lacuna] geracional gigante, um fosso mesmo. Os filhos estão na época do Discord, comentam tudo por lá. Precisamos conhecer o universo deles, interagir com eles: é mais o ‘quero entender’ do que o ‘quero ensinar’”, afirma Telma.
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