Cidades alemãs oferecem estadia grátis para atrair moradores

Programa oferece moradia quase gratuita em cidade alemã para atrair novos moradores e combater envelhecimento populacional, preconceito e avanço da extrema direita. Guben, na fronteira com a Polônia
Adobe Stock
Municípios no leste do país estão convidando interessados a se hospedar na região, na esperança de incentivá-los a virar moradores. Crise demográfica e ultradireita preocupam. "Não é difícil encontrar acomodações com preços acessíveis, não há engarrafamentos, não há hora do rush e nunca tive dificuldade em encontrar vaga para estacionar", diz Anika Franze, sorridente, atrás de sua mesa no centro da pequena cidade de Guben.
A mulher de 38 anos nasceu em Berlim Oriental, na antiga Alemanha comunista, e viveu a maior parte da sua vida antes e depois da queda do muro no mesmo bairro da capital. Mas ela diz que a agitação, a sensação de impotência em relação à crescente desigualdade e a dificuldade do mercado imobiliário há muito a faziam querer partir.
Dirigindo seu carro pelo estado vizinho de Brandemburgo, tendo apenas a rádio local como companhia, ela ouviu falar de um programa de "moradia de teste" (Probewohnen), que oferecia às pessoas a chance de se hospedar gratuitamente por até quatro semanas em Guben, na fronteira com a Polônia. A ideia era incentivar mais pessoas a se mudarem para a cidade e ajudar a combater o despovoamento.
Franze mora aqui há oito meses e agora gerencia o projeto que a trouxe à cidade. No local, ela consegue alugar um apartamento de 100 metros quadrados com closet por menos do que pagaria por um quarto em um dos apartamentos compartilhados menos desejáveis de Berlim.
"Aqui é sempre tranquilo, não há poluição sonora, há menos lixo nas ruas e você sempre encontra pessoas conhecidas, o que acho muito bom", explica ela durante um tour pelo centro da cidade, que inclui um rápido passeio à beira do rio Neisse para comer um bolo sofisticado em um café polonês.
Trinta pessoas participaram do programa de Guben no ano passado, e seis delas se mudaram para cá para ficar por um longo período. Franze diz que mais pessoas buscaram o programa como resultado da cobertura da imprensa.
Projetos semelhantes também foram lançados em cidades próximas na região de Lusácia, incluindo Frankfurt (Oder) e, mais recentemente, em Eisenhüttenstadt, originalmente chamada de Stalinstadt, a primeira cidade-modelo socialista planejada e construída na finada República Democrática Alemã.
Novas soluções para população em declínio
Guben é apenas uma das centenas de cidades industriais da antiga Alemanha Oriental que passaram por grandes mudanças demográficas após a Reunificação Alemã, em 1990. O declínio da taxa de natalidade, a emigração em especial de jovens para estados do oeste do país e o aumento da expectativa de vida aceleraram o envelhecimento da população.
Atualmente, 16,6 mil pessoas vivem em Guben, quase metade dos 29,1 mil habitantes registrados em 1995. Espera-se que esse número diminua mais 16% até 2030, com uma redução estimada de 27% na população em idade produtiva. A idade média atual é de 58 anos, e segue aumentando. "Estamos perdendo uma geração inteira", disse o prefeito da cidade, Fred Mahro, ao jornal TAZ quando o programa foi lançado.
No outono passado, a Bertelsmann Stiftung, uma fundação independente da sociedade civil, publicou um estudo que concluiu que a Alemanha continuaria dependendo da imigração para cobrir sua demanda estimada do mercado de trabalho. Além disso, devido à situação demográfica parecida em outros países europeus, a migração teria que vir de países de fora da UE.
"Do ponto de vista econômico, precisamos garantir que os locais continuem atrativos, que sejam criados incentivos para que as empresas se instalem lá, mas é muito mais do que isso – por exemplo, uma cultura acolhedora e interação social", diz Susanne Schultz, especialista em política de migração da Fundação Bertelsmann.
Schultz aponta para uma pesquisa publicada pela Agência Federal de Emprego na semana passada, mostrando que pouco mais de um quarto das pessoas nascidas no exterior e que imigraram para a Alemanha entre 18 e 65 anos consideraram no ano passado deixar o país.
Dois terços dos entrevistados citaram a discriminação como motivo para partir, e um terço disse não se sentir bem-vindo ou apenas ligeiramente bem-vindo. A retórica e as políticas de imigração, como, por exemplo, a recente decisão de impedir que as famílias de certos grupos de refugiados se mudem para a Alemanha, estão enviando sinais errados, segundo Schultz.
"A insatisfação com a política foi o principal motivo, e acho que muito disso tem a ver com os acontecimentos do último ano e meio – o clima realmente mudou na Alemanha", disse ela à DW, acrescentando que é necessária uma abordagem multifacetada para ajudar as pessoas a se integrarem social e economicamente.
Foto aérea da paisagem urbana da cidade de Guben
Adobe Stock
O problema de imagem provocado pela ultradireita
No esforço para atrair novos residentes, os estados do leste da Alemanha também têm que lidar com o problema da imagem associada a ser um dos berços do extremismo de direita. Guben ganhou as manchetes em 1999 quando um requerente de asilo argelino, Farid Guendoul, sangrou até a morte ao colidir contra uma vidraça enquanto fugia de neonazistas.
Cerca de 42% dos moradores locais votaram no partido de ultradireita Alternativa para a Alemanha (AfD) nas eleições federais de fevereiro de 2025. Franze diz que os números não refletem a vida cotidiana na cidade, e está frustrada com o foco na AfD, quando quase 60% dos moradores votaram em partidos moderados ou liberais.
"As pessoas têm seus preconceitos e clichês, mas, pela minha experiência, ainda é possível se conectar com elas, talvez elas só precisem de um pouco de tempo porque não estão acostumadas com muita diversidade", diz. "Não imagino que seja diferente em qualquer outra pequena cidade europeia."
Agora no seu segundo ano, o programa em Guben recebeu 40 inscrições de toda a Alemanha, bem como da Bélgica, Argélia, Egito e Brasil. Os candidatos selecionados serão alojados em apartamentos recém-reformados por uma contribuição de apenas 100 euros.
Há também a oportunidade de participar de encontros sociais semanais com os moradores, fazer uma contribuição artística para a cidade em cooperação com um museu local e fazer um estágio em uma empresa local.
Guben já foi famosa por sua indústria têxtil e chapelaria: os primeiros chapéus de feltro de lã à prova de intempéries foram fabricados aqui, e uma fábrica de fibras sintéticas, inaugurada em 1960, foi por muito tempo a maior empregadora do distrito.
Investimentos da União Europeia e do governo alemão estão agora sendo injetados na região da Lusácia, à medida que a mineração de lignite, também conhecida como carvão marrom, é gradualmente eliminada como parte da transição para uma economia neutra em carbono.
Franze diz que atualmente há cerca de 300 vagas de emprego abertas: a fabricante americana de salames BiFi abriu uma fábrica aqui em 2024, a rede de padarias Dreissig também tem uma unidade de produção no local e a produtora canadense de baterias de lítio Rock Tech vai inaugurar uma fábrica do tamanho de 17 campos de futebol.
No momento, Franze desfruta de uma vida um pouco mais tranquila do que na capital alemã, e realizou seu sonho de infância de aprender a andar a cavalo. "Não sei se quero envelhecer aqui, mas também não sei se gostaria de fazer isso em Berlim", diz.
LEIA TAMBÉM:
Programa oferece moradia quase gratuita em cidade alemã para atrair novos moradores e combater envelhecimento populacional, preconceito e avanço da extrema direita
Portugal: Como país se tornou destino popular de aposentados brasileiros
Adobe Stock
Municípios no leste do país estão convidando interessados a se hospedar na região, na esperança de incentivá-los a virar moradores. Crise demográfica e ultradireita preocupam. "Não é difícil encontrar acomodações com preços acessíveis, não há engarrafamentos, não há hora do rush e nunca tive dificuldade em encontrar vaga para estacionar", diz Anika Franze, sorridente, atrás de sua mesa no centro da pequena cidade de Guben.
A mulher de 38 anos nasceu em Berlim Oriental, na antiga Alemanha comunista, e viveu a maior parte da sua vida antes e depois da queda do muro no mesmo bairro da capital. Mas ela diz que a agitação, a sensação de impotência em relação à crescente desigualdade e a dificuldade do mercado imobiliário há muito a faziam querer partir.
Dirigindo seu carro pelo estado vizinho de Brandemburgo, tendo apenas a rádio local como companhia, ela ouviu falar de um programa de "moradia de teste" (Probewohnen), que oferecia às pessoas a chance de se hospedar gratuitamente por até quatro semanas em Guben, na fronteira com a Polônia. A ideia era incentivar mais pessoas a se mudarem para a cidade e ajudar a combater o despovoamento.
Franze mora aqui há oito meses e agora gerencia o projeto que a trouxe à cidade. No local, ela consegue alugar um apartamento de 100 metros quadrados com closet por menos do que pagaria por um quarto em um dos apartamentos compartilhados menos desejáveis de Berlim.
"Aqui é sempre tranquilo, não há poluição sonora, há menos lixo nas ruas e você sempre encontra pessoas conhecidas, o que acho muito bom", explica ela durante um tour pelo centro da cidade, que inclui um rápido passeio à beira do rio Neisse para comer um bolo sofisticado em um café polonês.
Trinta pessoas participaram do programa de Guben no ano passado, e seis delas se mudaram para cá para ficar por um longo período. Franze diz que mais pessoas buscaram o programa como resultado da cobertura da imprensa.
Projetos semelhantes também foram lançados em cidades próximas na região de Lusácia, incluindo Frankfurt (Oder) e, mais recentemente, em Eisenhüttenstadt, originalmente chamada de Stalinstadt, a primeira cidade-modelo socialista planejada e construída na finada República Democrática Alemã.
Novas soluções para população em declínio
Guben é apenas uma das centenas de cidades industriais da antiga Alemanha Oriental que passaram por grandes mudanças demográficas após a Reunificação Alemã, em 1990. O declínio da taxa de natalidade, a emigração em especial de jovens para estados do oeste do país e o aumento da expectativa de vida aceleraram o envelhecimento da população.
Atualmente, 16,6 mil pessoas vivem em Guben, quase metade dos 29,1 mil habitantes registrados em 1995. Espera-se que esse número diminua mais 16% até 2030, com uma redução estimada de 27% na população em idade produtiva. A idade média atual é de 58 anos, e segue aumentando. "Estamos perdendo uma geração inteira", disse o prefeito da cidade, Fred Mahro, ao jornal TAZ quando o programa foi lançado.
No outono passado, a Bertelsmann Stiftung, uma fundação independente da sociedade civil, publicou um estudo que concluiu que a Alemanha continuaria dependendo da imigração para cobrir sua demanda estimada do mercado de trabalho. Além disso, devido à situação demográfica parecida em outros países europeus, a migração teria que vir de países de fora da UE.
"Do ponto de vista econômico, precisamos garantir que os locais continuem atrativos, que sejam criados incentivos para que as empresas se instalem lá, mas é muito mais do que isso – por exemplo, uma cultura acolhedora e interação social", diz Susanne Schultz, especialista em política de migração da Fundação Bertelsmann.
Schultz aponta para uma pesquisa publicada pela Agência Federal de Emprego na semana passada, mostrando que pouco mais de um quarto das pessoas nascidas no exterior e que imigraram para a Alemanha entre 18 e 65 anos consideraram no ano passado deixar o país.
Dois terços dos entrevistados citaram a discriminação como motivo para partir, e um terço disse não se sentir bem-vindo ou apenas ligeiramente bem-vindo. A retórica e as políticas de imigração, como, por exemplo, a recente decisão de impedir que as famílias de certos grupos de refugiados se mudem para a Alemanha, estão enviando sinais errados, segundo Schultz.
"A insatisfação com a política foi o principal motivo, e acho que muito disso tem a ver com os acontecimentos do último ano e meio – o clima realmente mudou na Alemanha", disse ela à DW, acrescentando que é necessária uma abordagem multifacetada para ajudar as pessoas a se integrarem social e economicamente.
Foto aérea da paisagem urbana da cidade de Guben
Adobe Stock
O problema de imagem provocado pela ultradireita
No esforço para atrair novos residentes, os estados do leste da Alemanha também têm que lidar com o problema da imagem associada a ser um dos berços do extremismo de direita. Guben ganhou as manchetes em 1999 quando um requerente de asilo argelino, Farid Guendoul, sangrou até a morte ao colidir contra uma vidraça enquanto fugia de neonazistas.
Cerca de 42% dos moradores locais votaram no partido de ultradireita Alternativa para a Alemanha (AfD) nas eleições federais de fevereiro de 2025. Franze diz que os números não refletem a vida cotidiana na cidade, e está frustrada com o foco na AfD, quando quase 60% dos moradores votaram em partidos moderados ou liberais.
"As pessoas têm seus preconceitos e clichês, mas, pela minha experiência, ainda é possível se conectar com elas, talvez elas só precisem de um pouco de tempo porque não estão acostumadas com muita diversidade", diz. "Não imagino que seja diferente em qualquer outra pequena cidade europeia."
Agora no seu segundo ano, o programa em Guben recebeu 40 inscrições de toda a Alemanha, bem como da Bélgica, Argélia, Egito e Brasil. Os candidatos selecionados serão alojados em apartamentos recém-reformados por uma contribuição de apenas 100 euros.
Há também a oportunidade de participar de encontros sociais semanais com os moradores, fazer uma contribuição artística para a cidade em cooperação com um museu local e fazer um estágio em uma empresa local.
Guben já foi famosa por sua indústria têxtil e chapelaria: os primeiros chapéus de feltro de lã à prova de intempéries foram fabricados aqui, e uma fábrica de fibras sintéticas, inaugurada em 1960, foi por muito tempo a maior empregadora do distrito.
Investimentos da União Europeia e do governo alemão estão agora sendo injetados na região da Lusácia, à medida que a mineração de lignite, também conhecida como carvão marrom, é gradualmente eliminada como parte da transição para uma economia neutra em carbono.
Franze diz que atualmente há cerca de 300 vagas de emprego abertas: a fabricante americana de salames BiFi abriu uma fábrica aqui em 2024, a rede de padarias Dreissig também tem uma unidade de produção no local e a produtora canadense de baterias de lítio Rock Tech vai inaugurar uma fábrica do tamanho de 17 campos de futebol.
No momento, Franze desfruta de uma vida um pouco mais tranquila do que na capital alemã, e realizou seu sonho de infância de aprender a andar a cavalo. "Não sei se quero envelhecer aqui, mas também não sei se gostaria de fazer isso em Berlim", diz.
LEIA TAMBÉM:
Programa oferece moradia quase gratuita em cidade alemã para atrair novos moradores e combater envelhecimento populacional, preconceito e avanço da extrema direita
Portugal: Como país se tornou destino popular de aposentados brasileiros
Para ler a notícia completa, acesse o link original:
0 curtidas
Notícias Relacionadas
Não há mais notícias para carregar
Comentários 0