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Motel Mustang: deslizamento de terra que soterrou imóvel em Salvador completa 36 anos

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Motel Mustang: deslizamento de terra que soterrou imóvel em Salvador completa 36 anos
Chuvas de maio de 1989 ultrapassaram média histórica e causaram diversos deslizamentos de terra. Nove pessoas morreram na tragédia do motel, localizado no bairro do Lobato. Soterramento do Motel Mustang completa 36 anos; relembre caso
Maio costuma ser um mês chuvoso em Salvador. Só neste ano, nos primeiros 15 dias do mês, choveu 11% a mais do que a média esperada. Apesar dos alagamentos registrados, o temporal não se compara a chuva torrencial de 1989, que culminou em diversos deslizamentos de terra. Entre eles, está o soterramento do Motel Mustang, que completa 36 anos nesta segunda-feira (19).
Por volta das 3h30 da madrugada do dia 19 de maio de 1989, a terra do Morro do Alto do Cabrito atingiu o motel, que ficava logo abaixo. Uma reportagem feita pela TV Bahia na época informou que o rompimento da contenção fez com que a terra soterrasse 33 dos 50 apartamentos. Nove pessoas morreram, entre clientes e funcionários.
Os corpos de um casal hospedado no quarto 11 foram os primeiros a serem achados. Um papel encontrado na recepção mostrou um pedido feito pelos clientes: queriam ser acordados às 4h do dia 19 de maio. A recepcionista telefonaria para o quarto apenas 30 minutos depois da terra atingir o motel.
Foto publicada no Jornal A Tarde em maio de 1989 mostra a quantidade de terra que atingiu o motel no bairro do Lobato, em Salvador
Jornal A Tarde
O g1 solicitou informações para a Defesa Civil de Salvador (Codesal), Polícia Civil e Departamento de Polícia Técnica (DPT), mas todos informaram que os documentos da época não existem mais. O Arquivo Público da Bahia e o Arquivo Público Municipal também não têm registros do acidente.
Reportagens antigas de jornais fornecidas pelo escritor Marcus Vinícius Rodrigues preservam a memória do que ocorreu naquele dia. Marcus Vinícius teve acesso ao material através do Instituto Geográfico da Bahia, enquanto escrevia o livro "Motel Mustang", lançado em 2024. A obra é descrita como "uma ficção inspirada em uma tragédia real".
Em uma das reportagens publicadas pelo Jornal A Tarde em 20 de maio de 1989, o delegado responsável pelo caso explicou que o motel estava sob interdição devido a localização imprópria, mas mesmo assim seguia em funcionamento. Além disso, um técnico da Superintendência de Manutenção e Conservação da Cidade (Sumac), que não foi identificado, informou que o motel foi construído de forma irregular, em um terreno arenoso inconsistente para um imóvel de grande porte.
Na edição do dia 24 de maio, uma reportagem do mesmo jornal aborda um protesto feito pelos familiares dos funcionários mortos. Já havia se passado dias desde o acidente, mas os corpos ainda não tinham sido encontrados. Segundo a esposa de um dos nove mortos, o dono do estabelecimento sabia dos riscos de desmoronamento e pediu que os funcionários não comentassem o assunto. Além disso, quem faltasse o serviço seria suspenso.
Reportagem da época mostra demora para encontrar corpos das vítimas
Jornal A Tarde
Segundo o escritor Marcus Vinícius Rodrigues, que era adolescente na época, o que despertou a curiosidade dos moradores de Salvador não foram os fatos relacionados ao desabamento do motel em si, mas sim a curiosidade a respeito das pessoas que estavam dentro do imóvel. Histórias amantes e traições tomaram conta da cidade - e mais tarde, inspiraram seu livro.
"Muitos desabamentos e deslizamentos de terra aconteceram naquele mês, mas o que chamou mais atenção foi o desabamento do motel justamente por causa dessa curiosidade das pessoas em saber quem estava lá", explicou.
Barulho assustador
Motel Mustang ficava no bairro do Lobato, em Salvador
TV Bahia
Apesar dos poucos registros físicos disponíveis para consulta, quem morava na região não esquece a tragédia. Da casa de Givanildo Barbosa, hoje com 38 anos, dava para ver o motel. Ele era apenas uma criança na época, mas cresceu com os relatos do que aconteceu naquela madrugada do dia 19 de maio.
"Minha avó contava que a terra tremeu e o barulho foi tão grande, que ela achou que o mundo estava acabando", disse.
O pai, o avô e o tio de Givanildo saíram desesperados de casa para tentar ajudar as vítimas. Segundo ele, foram os moradores do Lobato que começaram as buscas por sobreviventes. Ele também contou que o volume de lama foi tão grande, que chegou até a Avenida Afrânio Peixoto, conhecida como Suburbana, e parte da via precisou ser interditada.
Depois dos corpos serem retirados e o caso investigado, o que sobrou do motel ficou abandonado. "Cresci vendo os restos do motel, era um lugar que dava calafrio ao passar", contou.
Segundo Givanildo, o local que antes era o motel virou o túnel que liga o Lobato a Pirajá. O g1 entrou em contato com a Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Urbanismo (Sedur) para confirmar a informação, mas não teve retorno até a publicação desta reportagem.
Chuvas de maio de 1989
Deslizamentos de terra deixaram x mortos em Salvador em 1989
TV Bahia
Em maio de 1989, a estação meteorológica de Salvador registrou 651 mm de chuva, de acordo com o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). O acumulado de água é considerado o segundo pior da série histórica 1961 - 2024, perdendo apenas para maio de 1966, quando foram registrados 703,7 mm. A média para o mês é de 302,2 mm.
Reportagens da época mostram os estragos causados pelas chuvas em maio daquele ano. Conforme matéria publicada pelo jornal A Tarde no dia 20 daquele mês, o número de mortos ultrapassou 65.
Só na semana do desabamento do Motel Mustang, a equipe de reportagem da TV Bahia registrou pelo menos 33 mortes:
Na madrugada do dia 17 de maio, uma encosta desabou na comunidade do Calabetão, soterrou dezenas de casas e matou 12 pessoas.
No mesmo dia, durante a noite, um outro deslizamento de terra matou 14 pessoas na região da Avenida Suburbana.
Na mesma semana, um casal e seus cinco filhos morreram em um outro deslizamento de terra no bairro do Lobato.
Além disso, em maio daquele ano 6 mil moradores de Salvador precisaram deixar suas casas devido ao risco de deslizamentos de terra, desabamentos e alagamentos. Eles foram abrigados no Parque de Exposições e no estádio da Fonte Nova. Campanhas nacionais ajudaram a arrecadar alimentos para as famílias.
Segundo o professor Marco Tomasoni, geógrafo e professor do Instituto de Geociências da Universidade Federal da Bahia (Ufba), a maioria das pessoas que sofria e ainda sofre com esse tipo de problema, mora em bairro periférico. Para ele, casos como os registrados em 1989 conotam racismo ambiental.
"Como essas áreas não são visibilizadas pelo capital, sofrem com o racismo ambiental e não recebem um planejamento urbano adequado", explicou.
Além das questões sociais, as ações de contenção de encostas, que são comuns hoje em dia, só se tornaram mais populares nos anos 2000. As tecnologias usadas atualmente para prevenir os moradores de possíveis deslizamentos, como sirenes e mensagens no celular, também não existiam.
"A formação da rede de alertas meteorológicos é mais recente, dos anos 2000. Ao longo dos anos, órgãos como a Codesal também se fortaleceram. Com certeza naquela época a cidade não estava preparada para as chuvas", afirmou.
O que mudou?
Buscas após deslizamento de terra em Salvador, em novembro de 2024
TV Bahia
Para o professor Marco Tomasoni, Salvador está mais preparada para lidar com chuvas acima da média do que em 1989. Apesar disso, os deslizamentos de terra e desabamentos recentes mostram que ela ainda está longe de ser uma cidade realmente preparada para temporais.
"Deveríamos estar mais preparados, ter mais estrutura e mais ações afetivas na questão da drenagem. Os eventos extremos não estão reduzindo, pelo contrário, e parece que só reforçamos a prevenção quando se perde algo", disse.
Segundo o geógrafo, as obras de contenção de movimento de massa nas encostas são um ponto de atenção. A impermeabilização, atualmente feita com concreto, garante uma segurança mais imediata para os moradores das áreas de risco, mas precisa de estudos rigorosos da área para não agravar o problema.
"Se for feita de forma errada, a água pode ficar presa dentro da contenção e causar um deslizamento maior no futuro", afirmou.
Outro problema desse tipo de impermeabilização é que ela aumenta a velocidade da água que cai na encosta. Como essa água não consegue escoar por causa do concreto, há o risco de alagamento nos locais que ficam abaixo.
O professor ainda pontuou que as transformações das áreas verdes estão relacionadas a problemas como alagamentos, afinal é a vegetação a maior responsável por drenar a água da chuva.
"As áreas verdes transformadas em concreto são amplificações de riscos futuros, porque implicam na drenagem da cidade. É como varrer um problema para debaixo do tapete", finalizou.
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