Aeronáutica conclui investigação sobre avião que caiu em BH e diz que piloto não podia voar

Piloto omitiu problemas de saúde à Anac, incluindo uso de medicamentos controlados para epilepsia. Ele também precisava utilizar óculos com lentes de correção, mas não estava com o acessório. Jéssica Oliveira e o pai José Luiz Oliveira
Redes sociais
O Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), órgão ligado à Força Aérea Brasileira (FAB), conclui o relatório sobre a queda de um avião no bairro Jardim Montanhês, na Região Noroeste de Belo Horizonte, em 2023. O documento descartou qualquer pane e indicou que o piloto, o médico José Luiz de Oliveira, de 65 anos, estava inapto a voar.
A aeronave, um Cessna R182, caiu sobre casas na Rua Morro da Graça. O homem não resistiu aos ferimentos e morreu no local. A filha dele, Jéssica Oliveira, estava no monomotor como passageira e sofreu ferimentos graves (leia mais abaixo).
Segundo o relatório, o piloto omitiu problemas de saúde incompatíveis com a atividade aérea à Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), incluindo o uso de medicamentos controlados para epilepsia, e passava por problemas pessoais que podem ter afetado seu estado emocional durante o voo.
Além disso, ele precisava utilizar óculos com lentes de correção, mas não estava com o acessório no momento do acidente, e teria feito a aplicação inadequada de alguns procedimentos e comandos.
Em relação à aeronave, a documentação necessária para que ela pudesse voar estava em dia, assim como a manutenção. Por isso, conforme o Cenipa, não houve indícios de que falhas mecânicas contribuíram para a ocorrência.
O g1 tenta contato com a família do piloto para um posicionamento.
Veja, abaixo, todos os detalhes sobre o relatório:
Dinâmica do acidente
Experiência
Exame toxicológico
Uso de óculos
Fatores psicológicos
Dinâmica do acidente
De acordo com o Cenipa, tratava-se de um voo diurno entre o Aeródromo Sílvio Gonçalves de Mello, em Morada Nova de Minas, e o Aeroporto Carlos Prates, em Belo Horizonte, com duração de 45 minutos e duas pessoas a bordo.
As condições meteorológicas eram favoráveis para voar sob regras visuais, e o piloto realizava a rota com certa frequência, estando familiarizado com a região.
Durante o pouso, a aeronave ultrapassou a cabeceira oposta e bateu contra duas casas localizadas abaixo da pista. A análise dos destroços confirmou que o trem de pouso estava recolhido, constatando a aplicação inadequada dos comandos durante o pouso.
"Também foi verificado que a respectiva alavanca de comandamento do trem de pouso estava na posição em cima. Câmeras de vigilância registraram a aeronave com o trem de pouso baixado durante a primeira aproximação e com o trem recolhido na segunda tentativa de pouso", disse o Cenipa.
O piloto não resistiu aos ferimentos e morreu no local. A passageira teve ferimentos graves.
Experiência
Conforme o Cenipa, o piloto tinha habilitações de Avião Monomotor Terrestre (MNTE) e Voo por Instrumentos - Avião (Ifra) em vigor, mas não foi possível afirmar que ele estava qualificado para o voo, porque não fazia o controle das horas voadas.
"O histórico operacional do PIC (piloto em comando) contava apenas com a experiência adquirida na formação e durante o período em que voou como piloto privado, sendo que ele não mantinha controle pessoal de horas de voo na sua Caderneta Individual de Voo. Na CIV digital, estavam registradas 254 horas e 16 minutos totais de voo e, aproximadamente, 4 horas no modelo do acidente, somente havendo registros a partir de sua habilitação IFRA, em 2005", disse o órgão.
Apesar disso, alguns observadores relataram que o piloto realizava voos para os aeroportos da Pampulha e Carlos Prates com frequência semanal, indicando que ele teria mais experiência no modelo R182 do que foi registrado.
"Entretanto, em virtude de não haver registro oficial das horas realizadas nos últimos 90 dias, conforme preconizava a seção 61.21 - 'Experiência Recente', do Regulamento Brasileiro da Aviação Civil (RBAC) nº 61, não foi possível afirmar que o PIC estava qualificado para realizar o voo", completou.
Exame toxicológico
O exame toxicológico pericial indicou a presença de barbitúricos (sedativos e calmantes) na urina do piloto. Segundo os relatos colhidos durante as investigações, o homem tinha histórico de epilepsia e estava em acompanhamento médico.
Os investigadores solicitaram à Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) os registros de saúde dele, como o Certificado Médico Aeronáutico (CMA). Esses documentos apresentaram discrepâncias entre os diagnósticos de comorbidades e as medicações em uso.
"Sobre o histórico médico, verificou-se que, desde a infância, o PIC sofria de casos de 'crise convulsiva' e, em período anterior à ocorrência, havia procurado auxílio médico para epilepsia. O PIC também realizou um eletroencefalograma e recebeu o diagnóstico de epilepsia do lobo temporal esquerdo", detalhou o relatório.
De acordo com o Cenipa, a doença não foi informada durante os exames de renovação do CMA.
Além disso, a análise dos áudios registrados entre o operador do serviço de informação de voo do aeródromo e o piloto sugerem que ele estava excessivamente calmo, inclusive com alguma letargia, dando a impressão de fala arrastada, o que poderia indicar algum comprometimento cognitivo.
"A não realização de um procedimento de arremetida, ao efetuar o pouso excessivamente longo, a poucos metros da cabeceira oposta, apontou não somente uma falha no processo decisório, mas também na atenção, com redução da possibilidade de uma resposta adequada e disfunção no sistema de alerta", afirmou.
Uso de óculos
O CMA indicava que o piloto deveria usar óculos, mas a perícia apontou que ele não estava com o acessório no momento do acidente.
"A não utilização de lentes corretoras ou óculos por um piloto com essa indicação pode contribuir para uma dificuldade na leitura dos instrumentos de voo e das cartas de navegação, podendo gerar ilusões durante o voo, especialmente no pouso. É possível que essas ilusões também induzam a uma falha de julgamento por parte do piloto", informou o Cenipa.
Fatores psicológicos
Ainda conforme as investigações, o piloto estava enfrentando problemas pessoais que podem ter influenciado negativamente o seu estado emocional e, consequentemente, a segurança de voo, afetando a capacidade de concentração e o julgamento durante a pilotagem.
"Um piloto sob tais influências pode apresentar sinais de distração, ansiedade ou letargia, interferindo em suas funções críticas. A carga emocional pode resultar em lapsos de memória e na incapacidade de seguir procedimentos estabelecidos, levando-o a encurtar ou pular etapas essenciais nos processos de verificação e operação da aeronave", afirmou o relatório.
Aeronave caiu sobre casas em BH.
Fred D'ávila/TV Globo
Procedimentos para retirada do avião que caiu no Jardim Montanhês tiveram início hoje (13)
Os vídeos mais vistos do g1 Minas:
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O Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), órgão ligado à Força Aérea Brasileira (FAB), conclui o relatório sobre a queda de um avião no bairro Jardim Montanhês, na Região Noroeste de Belo Horizonte, em 2023. O documento descartou qualquer pane e indicou que o piloto, o médico José Luiz de Oliveira, de 65 anos, estava inapto a voar.
A aeronave, um Cessna R182, caiu sobre casas na Rua Morro da Graça. O homem não resistiu aos ferimentos e morreu no local. A filha dele, Jéssica Oliveira, estava no monomotor como passageira e sofreu ferimentos graves (leia mais abaixo).
Segundo o relatório, o piloto omitiu problemas de saúde incompatíveis com a atividade aérea à Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), incluindo o uso de medicamentos controlados para epilepsia, e passava por problemas pessoais que podem ter afetado seu estado emocional durante o voo.
Além disso, ele precisava utilizar óculos com lentes de correção, mas não estava com o acessório no momento do acidente, e teria feito a aplicação inadequada de alguns procedimentos e comandos.
Em relação à aeronave, a documentação necessária para que ela pudesse voar estava em dia, assim como a manutenção. Por isso, conforme o Cenipa, não houve indícios de que falhas mecânicas contribuíram para a ocorrência.
O g1 tenta contato com a família do piloto para um posicionamento.
Veja, abaixo, todos os detalhes sobre o relatório:
Dinâmica do acidente
Experiência
Exame toxicológico
Uso de óculos
Fatores psicológicos
Dinâmica do acidente
De acordo com o Cenipa, tratava-se de um voo diurno entre o Aeródromo Sílvio Gonçalves de Mello, em Morada Nova de Minas, e o Aeroporto Carlos Prates, em Belo Horizonte, com duração de 45 minutos e duas pessoas a bordo.
As condições meteorológicas eram favoráveis para voar sob regras visuais, e o piloto realizava a rota com certa frequência, estando familiarizado com a região.
Durante o pouso, a aeronave ultrapassou a cabeceira oposta e bateu contra duas casas localizadas abaixo da pista. A análise dos destroços confirmou que o trem de pouso estava recolhido, constatando a aplicação inadequada dos comandos durante o pouso.
"Também foi verificado que a respectiva alavanca de comandamento do trem de pouso estava na posição em cima. Câmeras de vigilância registraram a aeronave com o trem de pouso baixado durante a primeira aproximação e com o trem recolhido na segunda tentativa de pouso", disse o Cenipa.
O piloto não resistiu aos ferimentos e morreu no local. A passageira teve ferimentos graves.
Experiência
Conforme o Cenipa, o piloto tinha habilitações de Avião Monomotor Terrestre (MNTE) e Voo por Instrumentos - Avião (Ifra) em vigor, mas não foi possível afirmar que ele estava qualificado para o voo, porque não fazia o controle das horas voadas.
"O histórico operacional do PIC (piloto em comando) contava apenas com a experiência adquirida na formação e durante o período em que voou como piloto privado, sendo que ele não mantinha controle pessoal de horas de voo na sua Caderneta Individual de Voo. Na CIV digital, estavam registradas 254 horas e 16 minutos totais de voo e, aproximadamente, 4 horas no modelo do acidente, somente havendo registros a partir de sua habilitação IFRA, em 2005", disse o órgão.
Apesar disso, alguns observadores relataram que o piloto realizava voos para os aeroportos da Pampulha e Carlos Prates com frequência semanal, indicando que ele teria mais experiência no modelo R182 do que foi registrado.
"Entretanto, em virtude de não haver registro oficial das horas realizadas nos últimos 90 dias, conforme preconizava a seção 61.21 - 'Experiência Recente', do Regulamento Brasileiro da Aviação Civil (RBAC) nº 61, não foi possível afirmar que o PIC estava qualificado para realizar o voo", completou.
Exame toxicológico
O exame toxicológico pericial indicou a presença de barbitúricos (sedativos e calmantes) na urina do piloto. Segundo os relatos colhidos durante as investigações, o homem tinha histórico de epilepsia e estava em acompanhamento médico.
Os investigadores solicitaram à Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) os registros de saúde dele, como o Certificado Médico Aeronáutico (CMA). Esses documentos apresentaram discrepâncias entre os diagnósticos de comorbidades e as medicações em uso.
"Sobre o histórico médico, verificou-se que, desde a infância, o PIC sofria de casos de 'crise convulsiva' e, em período anterior à ocorrência, havia procurado auxílio médico para epilepsia. O PIC também realizou um eletroencefalograma e recebeu o diagnóstico de epilepsia do lobo temporal esquerdo", detalhou o relatório.
De acordo com o Cenipa, a doença não foi informada durante os exames de renovação do CMA.
Além disso, a análise dos áudios registrados entre o operador do serviço de informação de voo do aeródromo e o piloto sugerem que ele estava excessivamente calmo, inclusive com alguma letargia, dando a impressão de fala arrastada, o que poderia indicar algum comprometimento cognitivo.
"A não realização de um procedimento de arremetida, ao efetuar o pouso excessivamente longo, a poucos metros da cabeceira oposta, apontou não somente uma falha no processo decisório, mas também na atenção, com redução da possibilidade de uma resposta adequada e disfunção no sistema de alerta", afirmou.
Uso de óculos
O CMA indicava que o piloto deveria usar óculos, mas a perícia apontou que ele não estava com o acessório no momento do acidente.
"A não utilização de lentes corretoras ou óculos por um piloto com essa indicação pode contribuir para uma dificuldade na leitura dos instrumentos de voo e das cartas de navegação, podendo gerar ilusões durante o voo, especialmente no pouso. É possível que essas ilusões também induzam a uma falha de julgamento por parte do piloto", informou o Cenipa.
Fatores psicológicos
Ainda conforme as investigações, o piloto estava enfrentando problemas pessoais que podem ter influenciado negativamente o seu estado emocional e, consequentemente, a segurança de voo, afetando a capacidade de concentração e o julgamento durante a pilotagem.
"Um piloto sob tais influências pode apresentar sinais de distração, ansiedade ou letargia, interferindo em suas funções críticas. A carga emocional pode resultar em lapsos de memória e na incapacidade de seguir procedimentos estabelecidos, levando-o a encurtar ou pular etapas essenciais nos processos de verificação e operação da aeronave", afirmou o relatório.
Aeronave caiu sobre casas em BH.
Fred D'ávila/TV Globo
Procedimentos para retirada do avião que caiu no Jardim Montanhês tiveram início hoje (13)
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